Incentivo aos mecanismos de pré-insolvência: tutela provisória na Lei 11.101/

Diante das notícias que preveem a desaceleração do crescimento econômico brasileiro [1], aliada à crise no segmento bancário estrangeiro [2], a insolvência empresarial voltou a ser pauta de primordial importância, não só no cenário brasileiro, como mundial, de modo que também ganharam destaque os mecanismos de pré-insolvência.

Com a entrada em vigor da Lei nº 14.112/2020, a regulamentação dos mecanismos de pré-insolvência foi inserida na Lei nº 11.101/2005 também por meio das cautelares antecedentes, que têm como escopo, a depender da medida escolhida, possibilitar a conciliação e a mediação entre as partes em caráter antecedente ao pedido de recuperação judicial, ou, então, possibilitar que o devedor se prepare melhor para o efetivo pedido, desde que cumpridos alguns requisitos.

De acordo com o artigo 20-B, § 1.º, da Lei nº 11.101/2005, o devedor tem a possibilidade de requerer a concessão de tutela de urgência cautelar, antecedente ao pedido de recuperação judicial, para que as partes possam negociar. Neste caso, é obrigatório que haja a “tentativa de composição com seus credores, em procedimento de mediação ou conciliação já instaurado perante o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) do tribunal competente ou da câmara especializada“.

Como consequência, há a suspensão das execuções que tramitam contra o devedor pelo prazo de 60 dias. Com essa ferramenta há a antecipação dos efeitos do stay period, de modo que o período de suspensão ocorrido na cautelar é deduzido da suspensão ocorrida no bojo da recuperação judicial (cf. artigo 20-B, § 3.º, da Lei nº 11.101/2005).

Por outro lado, o artigo 6º, § 12, da Lei nº 11.101/2005 estabeleceu outro requerimento a título de tutela provisória para casos em que fique demonstrado o perigo de dano, a teor do artigo 300 do CPC. Como exemplo, cite-se a possibilidade de constrições imediatas de ativos do devedor efetivadas por credores potencialmente sujeitos à eventual recuperação judicial, o que poderia comprometer a estruturação de uma negociação coletiva. Neste tipo de cautelar, apesar de inexistir disposição literal, parcela da doutrina tem se posicionado no sentido de que seria necessário que o devedor demonstre que não há prazo hábil para providenciar a documentação do artigo 51 da Lei nº 11.101/2005, necessária para o requerimento de recuperação judicial (cf. entendimento de Marcelo Barbosa Sacramone na obra Comentários à Lei de recuperação de empresas e falência. São Paulo: Saraiva Educação. 2021. p. 92).

Neste contexto, observa-se uma distinção importante entre essa tutela provisória de urgência e aquela prevista no artigo 20-B, § 1.º, da LREF, eis que esta última tem o intuito de conciliação e/ou mediação entre as partes, enquanto que aquela prevista no artigo 6º, § 12 tem o intuito, potencialmente, de antecipar efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial, o que pode ser total ou parcial, a depender dos motivos e da abrangência do pedido.

Assim, a cautelar prevista no artigo 20-B, § 1º, da Lei nº 11.101/2005 pode ser muito benéfica aos players de uma recuperação judicial, pois estimula que todos os interesses sejam levados em consideração. Vale destacar que o sistema de pré-insolvência que incentiva a conciliação e a mediação foi inspirado no modelo francês da conciliacion, do mandat ad hoc e da moratorium do direito britânico [3], aliando-se à intenção do legislador de tornar a Lei nº 11.101/2005 mais assimilável ao cenário econômico e social do país que emergiu com a pandemia, muito embora o contexto atual seja outro.

Assim, a intenção é que as “futuras” partes de uma recuperação judicial busquem um denominador comum, equilibrando a preservação empresarial com a satisfação do crédito, sem que nenhum dos envolvidos se sacrifique excessivamente para esse fim, considerando, especialmente, a complexidade de interesses heterogêneos que compõem uma recuperação judicial, de modo que as políticas de resolução de conflitos contemporâneas, em especial a conciliação e a mediação, passaram a ter tanto enfoque a partir da regulamentação ocorrida a partir da vigência da Lei nº 14.112/2020.

Diante dessas novas disposições na lei e considerando o aumento das situações de crise dos agentes econômicos, muito debateu-se sobre o tema no Fórum Nacional de Recuperação Empresarial e Falências (Fonaref), sendo que a maioria dos 15 enunciados aprovados versam, fundamentalmente, sobre o requerimento de tutela provisória previsto no artigo 20-B, § 1.º, da Lei nº 11.101/2005 [4].

A intenção da criação dos enunciados é orientar juízes, advogados e demais operadores do direito a respeito de pontos iniciais de divergência sobre a matéria, buscando unificar a atuação das partes, criando-se cada vez mais um cenário de negociação e menor litígio.

Na ocasião, foram definidas questões importantes quanto à cautelar prevista no artigo 20-B, § 1º, da Lei nº 11.101/2005, a saber: (1) o prazo de 60 dias de suspensão previsto como uma espécie de antecipação do stay period é improrrogável; (2) o prazo de 30 dias previsto no artigo 308 do CPC não se aplica a essa cautelar; (3) a medida cautelar vincula os credores convidados a participar do procedimento de mediação ou conciliação instaurado no Cejusc do tribunal competente ou na câmara privada, ainda que não tenham aceitado o convite, não vinculando os credores que não tenham sido convidados; e (4) a devedora não poderá renovar o requerimento de suspensão depois de cessada a sua eficácia, salvo em relação a credores que não participaram do procedimento de mediação ou conciliação.

A tendência é que, cada vez mais, as tutelas provisórias previstas nos referidos dispositivos sejam utilizadas pelas empresas em estado de crise, e, naqueles casos cuja intenção for promover a negociação e a conciliação entre as partes, certamente os enunciados orientarão os operadores do direito em como proceder, buscando sempre atribuir maior efetividade e êxito aos processos de recuperação judicial.

Fonte: ConJur
Disponivel em : https://www.conjur.com.br/2023-mai-05/fachini-macedo-incentivo-aos-mecanismos-pre-insolvencia

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